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Hoje é dia de festejar a poesia

Dia Mundial da Poesia foi o dia escolhido durante a 30ª Conferência Geral da Unesco, em 1999

Alexandra Cavalcanti

Ela está presente em tudo, embora nem sempre seja percebida. O romancista e poeta francês Victor Hugo costumava dizer que a poesia “é tudo o que há de íntimo em tudo”. Isso talvez justifique o fato dessa arte perdurar em um mundo em que as palavras perdem cada vez mais espaço para a imagem. No Dia Internacional da Poesia, celebrado neste dia 21, quando também se comemora o aniversário do poeta paraense Bruno de Menezes, pessoas dedicadas e apreciadoras da arte comentam sobre a importância dela em meio a tantas mudanças.

O poeta, escritor e jornalista Édson Coelho, acredita que para ser arte, tem que chegar à poesia. “Música, dança, pintura. Um poema é poesia por palavras. Diz-se que a poesia acabou. Besteira. Nunca vai acabar, por causa da esperança, do amor, da beleza, do tempo: da existência. A poesia, essa com palavras, sempre teve acesso restrito, por causa da linguagem mais elaborada. Essa falta de acessibilidade se aprofundou? Sim, primeiro porque a história conduziu essa poesia para a linguagem, justamente o fulcro das dificuldades. Depois porque leitores são cada vez menos encontráveis, também na prosa: quem lê? A questão da (falta de) leitura é geral. Não vejo a imagem em oposição à poesia”, analisa.

Para ele, o problema é que a imagem é distração, sobretudo, e não conhecimento. “Então não acho que a questão da poesia passe por desafios em oposição à imagem. O desafio aí é fazer a poesia chegar às pessoas, não é a produção em si. E fazer chegar depende mesmo é do sistema de ensino, da educação, de fazer a poesia chegar às pessoas com o mínimo de profundidade, entrar nas pessoas, e não em simplesmente estar à disposição, como na internet. Quem sabe ler poesia? Essa é a questão”, afirma.

O incentivo à leitura de poesias, segundo ele, é essencial para criar leitores desse gênero. “Leia para uma criança. Explique, para que a criança se deslumbre, se extasie, tenha um contato real com aquela beleza, aquela profundidade. Promova contatos prazerosos entre as pessoas e os poemas. Leve entendimento, universos novos, sentimentos verdadeiros com nosso principal código de comunicação, a palavra. É só isso. Apreciar intensamente significa viver a felicidade de ter contato real com essa beleza, independente de idade”, orienta.  

O escritor lembra ainda da importância do aniversariante do dia para essa valorização e perpetuação da poesia e da cultura como um todo. “Batuque, o livro mais conhecido de Bruno, é patrimônio brasileiro sobre a negritude, sobre a cultura negra. Num país miscigenado como o nosso, onde os negros sofrem as principais consequências sociais de quase tudo, ler ‘Batuque’ é uma obrigação estética e sociológica”, diz.

Ele destaca ainda que ler Bruno tem outras dimensões fundamentais. “Por exemplo, a valorização do povo, dos temas populares, dos sentimentos e criações populares, que chamamos de folclore: ele foi um grande folclorista e considero fundamental saber o que somos, de onde viemos e o que sentimos enquanto povo, e para isso o folclore é fundamental”, reforça. O escritor lembra que há também uma dimensão extraordinária para a arte, que é fazer o novo, renovar, fazer a estética, a forma, andar para a  frente, em vez de estacionar ou retroagir. “Bruno de Menezes foi modernista antes de Drummond, antes de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraná, ajudando a publicar aqui a revista ‘Belém Nova’, ainda em 1923. A pintora Anita Malfatti foi esculachada no sul e sudeste por personalidades como Monteiro Lobato, que não alcançavam sua estética modernista; já quando ela veio a Belém, Bruno se moveu pela cidade divulgando sua presença, apresentou-a para intelectuais paraenses, arranjou encontros, debates. Bruno era moderno por natureza, à frente sem dúvida de seu tempo, e isso é fundamental para nossos jovens, esse sopro de renovação, esse estímulo, essa visão viva da arte, numa perspectiva histórica”, completa.

Prosa poética - Monique Malcher é escritora e artista plástica nascida em Santarém. Atualmente, ela reside em São Paulo. Seu livro “Flor de Gume", publicado pela Editora Jandaíra, com edição da escritora Jarid Arraes, foi o ganhador do Prêmio Jabuti 2021 na categoria Contos. A obra foi lida por mais de 20 clubes de leitura espalhados pelo país em quase dois anos, sendo alguns do projeto Leia Mulheres e um do Memorial da América Latina. Monique também atua como pesquisadora, é mestre em antropologia (UFPA) e doutoranda interdisciplinar em ciências humanas (UFSC) com pesquisa em literatura e quadrinhos produzidos por mulheres. Para ela, um dos grandes desafios atuais é compreender que não existe lado oposto ao falar de poesia e imagem. “A poesia cria imagens que aos olhos podem ser antigas, mas no tecer literário são crianças, nesse sentido de novidade e descoberta do mundo. A poeta é essa trabalhadora que faz da argila um vaso, a imagem que comporta vida/morte. Enquanto tratarmos a poesia como esse movimento onde a palavra não gera imagem e a imagem não gera poesia só vamos ganhar o afastamento de leitores, que nos perguntam o que é a poesia? Respondo também com uma pergunta: o que não é? Porque o poema é uma estrutura, poesia vai além de qualquer estrutura”, justifica.

Em sua avaliação, se iniciar na leitura de poesias não precisa ser um processo doloroso, por isso, é fundamental se dedicar àquilo que se gosta e se identifica. “Creio que é preciso ler aquilo que chega ao coração, mesmo que pareça clichê. Tentar começar com autorias próximas de gostos que já estão dentro de nós e depois passar aos desafios de temas mais distantes. Sempre falo da importância de ler mulheres na poesia, de não ler apenas os cânones masculinos. E entender que um livro de poemas tem um tempo diferente, você não precisa terminar em uma hora ou um dia porque parece fisicamente curto. Calma. Respire. Leia verso por verso, repita a leitura do poema, feche o livro, fique pensando nele e com ele, como quem revive um encontro com um grande amor. Depois volte, releia e se surpreenda com o tempo e como as palavras amadureceram dentro de você. A pressa não combina com o encontro de quem lê com a poesia”, ensina.

Sobre Bruno de Menezes, a escritora é enfática. “Ele traz a poética que fala não apenas sobre amor, mas sobre questões afroamazônidas. Nesse momento em que estamos falando de modernismo e semana de arte moderna posso dizer que é necessário revisitar a poesia de Bruno para compreender que muito nos foi levado por autorias de outros cantos, e que ele é também parte do modernismo e desse movimento gigante que não há palavra que caiba, de nosso lugar pra nossa gente, mas não só”, afirma.

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