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Marajó precisa de políticas de educação específicas, diz prefeito de Soure

Guto Gouvêa (PL) acredita que é preciso adaptar expectativas do Governo Federal para a realidade do arquipélago

Eduardo Laviano

O presidente da Associação de Municípios do Marajó e prefeito de Soure, Guto Gouvêa (PL), participou na última terça-feira (21) da entrega de um relatório do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) do Pará que diagnostica os gargalos da educação nas 17 cidades da região. O documento oferece ideias para diminuir os índices de evasão escolar e reprovação no arquipélago, que estão bem acima da média do Pará e do Brasil. Em entrevista para O Liberal, ele repercute a iniciativa, fala sobre as peculiaridades da região e se diz desapontado com o programa Abrace o Marajó, do Governo Federal. "Não vimos efetividade", diz. 

Como o senhor recebeu esses dados do TCM?

A gente vê com um olhar de esperança. Essa é a primeira etapa e as soluções vão vir a partir daí. Mas, tendo o diagnóstico feito por técnicos, ele pode nos nortear muito melhor. É aquela coisa: às vezes estamos em casa e não conseguimos ver os problemas da nossa própria casa. Tivemos um órgão externo que veio e realizou este trabalho. Isso traz uma esperança grande de que podemos melhorar a educação do município. 

Tem algum desafio que precisa ser tratado como prioridade?

São vários itens. Tem a ajuda do TCM para a sensibilização da questão do cardápio, para que o Ministério da Educação aceite um cardápio diferente para a região do Marajó, principalmente na questão das proteínas, para que possa ser permitida a compra de proteínas específicas que tenham só no nosso Marajó e, assim, elas possam entrar no cardápio das crianças. É uma questão que implica em todo o Marajó. 90% das nossas escolas estão no interior, em áreas ribeirinhas e de campo aberto. Isso implica numa logística muito grande, medida em horas e não em quilômetros. O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação precisa ver isso. Além disso, precisamos manter um padrão de que o ensino na cidade seja tão bom quanto o da zona ribeirinha, onde você tenha facilidade de acesso a internet e energia elétrica. Vemos escolas muito bem equipadas, com infraestrutura muito boa, e escolas com infraestrutura precária. E, quando vamos avaliar, elas tem o mesmo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica. Então só um diagnóstico muito bem feito para saber onde devemos atacar. É importante que os bons exemplos de gestão de educação possam ser divulgados.

Como Soure tem lidado com essa questão da contratação de serviços de alimentação e transporte?

Lá temos um relato muito interessante, pois nós mexemos a fundo no cardápio da merenda escolar. Nós saímos de menos de 30% da merenda escolar sendo fornecida pela a agricultura familiar e passamos para 65%. Talvez seja o índice mais alto do Pará e nos levou ao prêmio Sebrae Empreendedor, que receberemos em Brasília semana que vem. Em Soure, temos um combo da merenda escolar que é o X-Búfalo, que é hambúrguer feito com carne de búfalo, chouriço do Marajó e queijo do Marajó, acompanhado do que chamamos de suco inteligente, que é adoçado com beterraba e de uma sobremesa, que pode ser um sorvete a base do leite de búfalo. Nós adaptamos muito bem isso. Em época de Círio temos até maniçoba no cardápio. Isso foi visto como um exemplo de sucesso e acaba atraindo o aluno para estar na escolar. Às vezes não conseguimos atrair o aluno somente com a parte pedagógica, então atraímos também dando uma boa alimentação.

E o que explica esses números tão grandes analfabetismo e evasão escolar na região?

Acho que essa questão deve-se muito ao fato do jovem chegar naquele período que ele tem que trabalhar para ajudar a família. Em áreas onde a economia é voltada para a extração do açaí, por exemplo, normalmente esse adolescente é o mais leve, o mais jovem, e, portanto, é o que sobe para apanhar o açaí. Tudo isso por necessidade econômica da família. Ele cedo começa a ajudar no sustento da casa. Isso provoca a evasão escolar e ele não volta mais para a sala de aula. Mudar essa realidade é muito difícil, pois estamos falando numa região pobre, de Índice de Desenvolvimento Humano baixo. Você ter que cortar mais ainda a renda da família com aquele aluno que colabora com a renda familiar é complicado. Na região onde o açaí é muito forte, é preciso fazer um ano letivo diferente do ano letivo que o governo brasileiro determina. Em vez das férias escolares, poderíamos substituí-las por aquele momento que ele tem que trabalhar, que é a safra do açaí. Não sei dizer de fato qual é a solução, mas a partir deste diagnóstico, teremos esse tipo de leitura. 

Como o senhor enxerga o projeto do governo federal que limita a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS)?

É algo muito populista. Se você falar que vai baixar combustível, jogar isso para a população, é claro que todo mundo se agrada. Mas é dar com uma [mão] e tirar com a outra. Porque há uma diminuição na arrecadação dos estados e municípios que será muito grande. O Fundo de Participação dos Municípios, ICMS e Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza são os poucos impostos que fazem com que um municípios se sustente. Quando você tem um município que depende desses repasses, sem repasses extras ou royalties, como é o caso do Marajó, vai ter uma queda de arrecadação significativa que, na ponta, vai ficar faltando para a população. Isso reflete em menos saúde, educação e infraestrutura urbana. Não sei se será aprovado ou não, mas é um olhar preocupante, principalmente na saúde e assistência social, onde as contas não batem. Houve um corte gigantesco do Governo Federal nessas áreas nos últimos anos.

Como está a situação do programa Abrace o Marajó, do governo federal? Algum avanço?

O Abrace o Marajó chegou como uma grande solução. Acho que todos os prefeitos se jogaram nesse projeto. E com o passar do tempo fomos vendo que não foi tendo efetividade. Hoje, a gente olha com uma certa desconfiança. Já era tempo de colhermos esses frutos e não estamos colhendo. Foi um programa único voltado para a região, uma visão muito específica que nos agradou e gerou esperança muito grande. Mas não vamos nenhuma efetividade. O que que melhorou de fato? O que o Marajó ganhou de fato? O que podemos colher de frutos? São frutos muito pequenos diante da ajuda que o Governo Federal poderia dar, como a redução de algum imposto pra quem estivesse aqui. Porque aí a gente abriria uma zona franca ampliada, que traria muito desenvolvimento. Ou alguma infraestrutura pujante como pontes, estradas. Mas nada disso foi feito. Tivemos esperança, mas não aconteceu. Ainda pode acontecer, claro, mas hoje somos muito mais incrédulos. 

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