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CPI tem bate-boca entre senadores e depoente nega demora na compra de vacinas

Reunião tem discussão acalorada e troca de xingamentos entre senadores.

THIAGO VILARINS - SUCURSAL DE BRASÍLIA (DF)

A reunião de ontem da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid teve um intenso bate-boca, logo no inicio, entre os senadores Otto Alencar (PSD-BA) e Marcos Rogério (DEM-RO). O baiano foi chamado de "covarde" pelo rondoniense, e respondeu: "Covarde é quem apoia o governo". O clima esquentou durante a votação do requerimento para convocação de Franciele Fantinato, coordenadora do Programa Nacional de Imunização (PNI), que deve prestar depoimento sobre a vacinação de gestantes.

Otto Alencar argumentou que os senadores Marcos Rogério e Luís Carlos Heinze (PP-RS) são contra a investigação da morte de parturientes. Marcos Rogério rebateu: "Não seja covarde. Você sabe o respeito que eu tenho por Vossa Excelência, mas não faça isso", atacou. Neste momento, o senador Otto Alencar se levantou e apontou o dedo ao parlamentar.

Fora dos microfones, afirmou: "Quem tem coragem está contra o governo", enfatizou. Com a discussão acalorada, a sessão foi interrompida em seguida. Ao retomarem os trabalhos, os senadores do colegiado aprovaram as novas convocações. Entre elas, está a do deputado Osmar Terra (MDB-RS), que já chegou a defender o uso de medicamentos sem comprovação científica para o tratamento da Covid-19, como a Cloroquina e a Ivermectina. Além disso, a oposição e os considerados independentes do colegiado querem saber se o ex-ministro da Cidadania integrou o chamado "gabinete paralelo" da saúde, que teria aconselhado o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) durante a pandemia do novo coronavírus.

Com este clima iniciou o depoimento do ex-secretário-geral do Ministério da Saúde Antônio Elcio Franco Filho. As perguntas dos senadores centraram fogo na relutância do governo federal em adquirir e financiar a CoronaVac, vacina produzida após acordo entre a China e o Instituto Butantan, de São Paulo; e nas negociações para a compra da vacina da Pfizer, multinacional do setor farmacêutico com sede nos Estados Unidos. O depoente defendeu todas as ações do governo.

Franco, que é coronel da reserva e hoje é assessor especial da Casa Civil, foi o segundo nome da hierarquia da pasta entre junho de 2020 e março de 2021, na gestão do general Eduardo Pazuello. O ex-secretário-executivo atribuiu a demora na compra da CoronaVac a dois fatores principais. O primeiro era a incerteza quanto à eficácia de imunizantes que ainda passavam pelo processo de testes, que, segundo ele, é "um cemitério de vacinas". O segundo fator teria sido a necessidade de adequar a legislação.

"Informamos ao pessoal do Butantan que não podíamos usar a 'encomenda tecnológica', instrumento para a compra da vacina da AstraZeneca, porque ela se presta a tecnologias inéditas, e no caso da CoronaVac era uma vacina de vírus inativado, tecnologia que o Butantan já domina. Houve necessidade de adequação do marco legal, o que ocorreu com a MP 1.026, em 6 de janeiro. Ato contínuo, foi assinado o contrato com o Butantan no dia 7", disse o coronel.

O presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), fez uma analogia com a compra de um apartamento, para criticar a demora na compra das vacinas. "Se o senhor está comprando um apartamento na planta, não está pronto ainda, o senhor não sabe se vai ter vazamento, mas está comprando. A mesma situação era a do Butantan. Naquele momento era muito importante. É isso, coronel, que nós não entendemos: por que a gente não comprou 60 milhões de vacinas do Butantan e 70 milhões da Pfizer?", questionou.

Ex- número 2 da Saúde diz que fala de Bolsonaro contra CoronaVac não interrompeu negociações

Senadores apontaram que as negociações entre a União e o Butantan foram suspensas por vários meses a partir de outubro de 2020, depois que o presidente da República, Jair Bolsonaro, mandou cancelar publicamente um protocolo de intenções assinado pelo Ministério da Saúde para aquisição de 46 milhões de doses da CoronaVac. O coronel  afirmou que, apesar das declarações do presidente, a negociação não foi interrompida, e deu a entender que a falta de iniciativa foi do Butantan.

A fala do ex-número 2 da Saúde difere da versão dada pelo diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, à CPI. Dimas Covas contou à comissão que as críticas de Bolsonaro à vacina produzida pelo Instituto Butantan travaram as negociações, que poderiam ter sido concluídas em outubro. O diretor do Butantan apontou como crucial a declaração de Bolsonaro, em outubro, dizendo que havia mandado cancelar a compra.

"O doutor Dimas Covas [diretor do Butantan] tinha meu telefone. Eles poderiam ter mandado mensagem para meu WhatsApp, poderiam ter conversado comigo. O problema que aconteceu foi a politização pelo governo do Estado de São Paulo", disse Franco.

Pfizer

Em relação à Pfizer, Elcio Franco Filho atribuiu a demora na compra às "cláusulas leoninas" impostas, segundo ele, pela empresa. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) listou as datas de 81 e-mails, 90% deles sem retorno, enviados pela Pfizer ao governo brasileiro, entre maio do ano passado e abril deste ano. Franco alegou que a falta de respostas deveu-se, entre outros motivos, a "problemas técnicos".

"A Pfizer às vezes mandava o mesmo e-mail três ou quatro vezes no mesmo dia. A minha caixa de e-mails, e a de todo o ministério, ficou inoperante entre 5 e 12 de novembro. Também o senhor Carlos Murillo [presidente da Pfizer Brasil] tinha meu telefone e podia ter se comunicado se tivesse algum gap."

Élcio nega a existência de "dois ministérios"

Foram exibidos vídeos de entrevistas coletivas concedidas pelo ex-secretário em 2020, em que ele declarava não haver "intenção" de compra de "vacinas chinesas" e chamava de "verdadeiros negacionistas" os que negavam a eficácia do tratamento precoce com medicamentos defendidos pelo governo, como a hidroxicloroquina. O relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL), se mostrou surpreso quando o depoente afirmou desconhecer a atuação do "gabinete paralelo" que aconselha o presidente sobre a pandemia. "Era uma espécie de 'Ministério da Doença', em contraposição ao Ministério da Saúde. Pelo que estamos vendo, 'paralelo' era o Ministério da Saúde", disse Renan.

Os senadores observaram que Franco se reuniu com Antônio Jordão de Oliveira Neto, membro do grupo pró-hidroxicloroquna Médicos pela Vida, apenas um dia depois que este sentou-se ao lado de Bolsonaro em uma reunião do chamado "gabinete paralelo". "Eu não me lembro, não sei de quem se trata. Posso ter me reunido, eu não sei qual foi a pauta", respondeu o ex-secretário-executivo, que admitiu apenas uma reunião com empresários, entre eles Carlos Wizard e Luciano Hang, para tratar da ideia da compra de vacinas para os funcionários de suas empresas. 

A senadora Simone Tebet (MDB-MS) afirmou que a omissão do governo na aquisição de vacinas foi deliberada e configura crime de responsabilidade. "Existiam dois ministérios na Saúde. O de V. Exa., que devia ser ouvido sempre, e o ministério paralelo", afirmou a senadora, após o coronel afirmar que a pasta não era consultado pelo Planalto para decretos, projetos, medidas provisórias e vetos sobre pandemia. 

O senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), líder do governo do Senado, defendeu a ação do Ministério da Saúde, afirmando que "houve uma justa preocupação com a segurança e a efetividade dos imunizantes". Citou um editorial do jornal norte-americano The New York Times criticando as exigências feitas pela Pfizer a governos de vários países. Franco aproveitou para atacar a atitude da multinacional durante a negociação de vacinas: "Diferente de outros laboratórios, nos pareceu que nem ela [Pfizer] confiava no que estava vendendo para a gente."

Outros senadores defenderam as ações do Ministério da Saúde. Marcos Rogério (DEM-RO) lembrou que a "fragilidade da atenção primária" no sistema de saúde brasileiro fez estados e municípios recomendarem que os infectados com sintomas leves não procurassem as unidades de atendimento, o que provocou mortes. Luis Carlos Heinze (PP-RS) disse que "se o tratamento precoce não fosse criminalizado, teríamos um número de mortes menor", e lamentou representação do senador Alessandro Vieira (SE) no Conselho de Ética, acusando a ele, Heinze, de disseminar "fake news" ao defender medicamentos sem eficácia comprovada contra a covid-19.

Depoente nega incompetência no PNI e na gestão da crise em Manaus

O senador Otto Alencar (PSD-BA) lembrou que o Ministério da Saúde só apresentou um Plano Nacional de Imunização (PNI) em dezembro, após exigência feita pelo Supremo Tribunal Federal (STF). "Senador, a portaria que designou a câmara técnica [para elaborar o PNI] remonta de bem antes. Essa câmara técnica vinha discutindo o teor de um plano", defendeu-se o depoente.

Otto discordou e acrescentou que o plano por fim apresentado foi "lamentável": "O plano era cheio de erros de programação, porque não existiu nunca a intenção de vacinar o povo brasileiro. A negação da vacina foi uma coisa evidente em todas as declarações do presidente da República."

Dois senadores do Amazonas, Omar Aziz (PSD), presidente da CPI, e Eduardo Braga (MDB), criticaram a gestão da crise de oxigênio em Manaus, no início deste ano. O ex-secretário-executivo garantiu que não faltou dinheiro para o estado do Amazonas e que a logística para o abastecimento de oxigênio foi a melhor possível. "No dia 12 de janeiro, ao tomar ciência da situação, já havia a aeronave da FAB transportando oxigênio líquido para Manaus. Tudo que estava ao nosso alcance, dentro de uma ação interministerial, nós fizemos", argumentou.

A resposta provocou uma reação veemente de Braga. "Pelo amor de Deus! No dia 15 de janeiro não estava equacionado o problema de oxigênio de Manaus e do Amazonas. Coronel, desculpe, não quero ser descortês, mas essa informação é mentirosa!", protestou.

Já o senador Alessandro Vieira manifestou estranheza por o Ministério da Saúde ter trocado o inquérito epidemiológico Epicovid, que testou 100 mil brasileiros para monitorar o impacto da pandemia no país a um custo de R$ 12 milhões, pelo PrevCov, que testará 211 mil brasileiros por um valor mais alto, R$ 200 milhões. O depoente afirmou não dispor de dados para responder.

Ao encerrar a reunião, Randolfe Rodrigues lamentou afirmação de Jair Bolsonaro nesta quarta, questionando a "comprovação científica" das vacinas: "A declaração de hoje deixa claro de quem é a responsabilidade do negacionismo das vacinas", lamentou o senador.

Governador do Amazonas pede ao STF para não depor na CPI da Covid

O governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para não depor na CPI da Covid. O habeas corpus foi ajuizado na terça-feira. Isso torna a reunião de hoje (10) em uma verdadeira incógnita. Caso a solicitação não seja atendida, o político pede para ficar em silêncio, já que é investigado por supostos desvios na saúde e tem o direito de não se autoincriminar.

Inicialmente, o depoimento de Lima estava marcado para o dia 29. Por causa de uma operação da Polícia Federal que investiga se houve desvios no Amazonas, o depoimento foi antecipado. "Em casos como o do paciente, essa Suprema Corte tem, em diversas oportunidades, concedido medidas cautelares para garantir a qualquer pessoa que seja convocada a prestar declarações ou depoimento, perante órgãos do Poder Legislativo, do Poder Executivo ou do Poder Judiciário, o direito de não ser injustamente constrangido ou cerceado em sua liberdade, quando for apenas facultativo o seu comparecimento ao órgão de investigação, bem como o direito de permanecer silente em tudo quanto possa vir a incriminá-lo", diz a solicitação.

Wilson Lima também diz que o comparecimento compulsório à CPI fere a separação entre os Poderes e a regra constitucional que prevê que a União não pode intervir nos Estados e no Distrito Federal. "A convocação para prestar declarações perante a CPI da Pandemia afronta as cláusulas pétreas da forma federativa do Estado e da separação de poderes, consubstanciando, ademais, violação de princípios constitucionais sensíveis relacionados à regra de não intervenção federal nos Estados e no Distrito Federal, salvo em casos excepcionais estabelecidos na própria carta magna, entre os quais não se enquadra a convocação de chefes dos poderes executivos estaduais por comissões parlamentares de inquérito", prossegue o pedido.

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