Tratamento da hanseníase precisa melhorar muito, diz relatora da ONU após visita ao Pará

Panorama estadual ainda está aquém do ideal, apesar de alguns avanços, diz coordenador do movimento de apoio a pessoas com hanseníase

Victor Furtado, com informações da EBC
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Alice Cruz, relatora da Organização das Nações Unidas (ONU), esteve no Pará e em alguns outros estados brasileiros. Ao final das visitas, constatou: pessoas com hanseníase ainda vivem segregadas da sociedade e o tratamento precisa melhorar muito. Historicamente, os registros oficiais de casos da doença vêm diminuindo no estado. Por outro lado, entidades de apoio falam em subnotificação elevada.

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Para Alice Cruz, algumas das piores situações de pessoas com hanseníase estão na Amazônia Legal. Ainda assim, considera que o Brasil é uma referência por ter criado um marco legal antidiscriminatório. Só que precisa pôr em prática políticas públicas efetivas para zerar as disparidades sociais. Principalmente a segregação que pacientes ainda vivem, quando moram em colônias.

O Pará foi escolhido para visitação devido aos altos registros da doença no estado. A agenda da relatora da ONU foi organizada por José Picanço, coordenador do Movimento de Reintegração de Pessoas Atingidas pela Hanseníase no Pará (Morhan-PA) e membro da Comissão Nacional de Filhos Separados pelo Isolamento Compulsório de PessoAs com Hanseníase.

A relatora da ONU visitou Belém, a ilha de Combu e Marituba. Picanço ressalta que as ponderações de Alice Cruz são pertinentes sobre a realidade do tratamento de pessoas com hanseníase. As colônias são espaços remanescentes das décadas de 1920 e 1940 e de fato estão em condições precárias, que acabam promovendo a segregação social.

Quanto ao estado, o coordenador do Morhan estadual aponta que há uma média de 2,4 mil casos por ano. No entanto, acredita que a subnotificação oculte o triplo de casos. Pesquisa de Cláudio Salgado, do Laboratório de Dermato-Imunologia (LDI), em Marituba, prevê que se o Pará não melhorar a estrutura de atendimento e tratamento, a situação pode chegar a níveis alarmantes, como no passado, e ir a 20 mil casos anuais. A maioria serão crianças.

"Estamos encontrando crianças já com sequelas irreversíveis da doença. Isso é um crime! Nossos principais desafios hoje são estimular os exames de contato; treinar pessoal para atendimento humanizado — muitos profissionais de saúde não querem atender por preconceito — e fiscalização desse atendimento; aumenta o número de cirurgias reparadoras; mais campanhas informativas; e aumentar a liberação de próteses e órteses para pessoas com sequelas", pontua Picanço.

 

Sespa garante redução do número de casos e elevada taxa de cura

 

Questionada sobre as declarações da relatora da ONU, a Secretaria de Estado de Saúde do Pará (Sespa) não comentou as falas. A resposta se focou em dizer que o tratamento da hanseníase no Pará tem índices de cura superiores a 70% e de abandono do tratamento inferiores a 10%. Desde 2015, o número de casos vem caindo sequencialmente.

Pelos parâmetros do Ministério da Saúde, o Pará ocupa o quarto lugar em incidência da doença, com 27,70 casos por cada 100 mil habitantes notificados em 2018, ficando atrás do Maranhão, Mato Grosso e Tocantins.

"Apesar da diminuição de casos e da eficácia do tratamento contra a hanseníase, essa classificação requer das Secretarias Municipais de Saúde a intensificação contínua das ações preventivas à doença junto à população", destacou a Sespa na nota.

A Coordenação Estadual de Controle da Hanseníase aponta que o número de casos da doença no Pará tem tido queda: 2015, com 3.338 casos; 2016 com 2.918; 2017 com 2.561 e 2018 com 2.314 ocorrências. Os dados mais atualizados apontam ainda que, neste ano, já foram confirmados 36 casos.

Em 2017, Belém, Ananindeua e Marabá apresentaram o maior número de casos da doença. No ano seguinte, Parauapebas foi agregada ao ranking. Este ano, os casos confirmados foram oriundos de Castanhal, Novo Progresso e Altamira.

 

image Laboratório Dermato-Imunológico (LDI) é uma das referências em análises e treinamento de profissionais para tratamento da hanseníase, assim como estruturas como o abrigo João Paulo II e a URE Marcello Candia (Agência Pará)

 

Hanseníase tem cura e tratamento é totalmente gratuito

 

A Sespa também informa que a hanseníase tem cura, com tratamento totalmente gratuito. Ao iniciar o tratamento, o paciente pára imediatamente de transmitir a doença. O diagnóstico e tratamento estão disponíveis em todas nas Unidades Básicas de Saúde, mantidas pelas Secretarias Municipais de Saúde, vinculadas às prefeituras.

Em Belém, o Programa de Controle da Hanseníase, com ações preventivas, diagnóstico e tratamento da doença, está implantado em 24 Unidades Municipais de Saúde e 54 Unidades Saúde da Família. O esquema terapêutico dispensado ao paciente é todo ambulatorial, ou seja, não necessita de internação.

O Pará tem uma taxa de cura de hanseníase de 76,9% e uma taxa de abandono de tratamento de apenas 7,3%. Esse resultado é atribuído ao trabalho, diz a Sespa, é desenvolvido pela Atenção Básica no Estado, principalmente pela equipe de enfermagem comprometida com o controle da doença.

A Coordenação Estadual de Controle da Hanseníase tem realizado treinamentos de profissionais em todos os municípios paraenses de forma contínua, como garante o órgão estadual de saúde. Cada atividade é composta de 12 horas teóricas e 28 horas práticas para assegurar que os médicos e enfermeiros saibam muito bem fazer o diagnóstico precoce de hanseníase.

 

Entenda o que é hanseníase

 

Hanseníase é uma doença crônica, que tem como agente etiológico o bacilo Micobacterium leprae. No passado, era conhecida como lepra. A infecção por hanseníase pode ocorrer em pessoas de ambos os sexos e de qualquer idade. Alice Cruz, a relatora da ONU, ressalta que tem difícil transmissão, já que é necessário um longo período de exposição à bactéria, motivo pelo qual apenas uma pequena parcela da população infectada chega a realmente adoecer.

A doença é transmitida pelas vias áreas superiores (tosse ou espirro), por meio do convívio próximo e prolongado com uma pessoa doente sem tratamento. A doença apresenta longo período de incubação, ou seja, há um intervalo, em média, de dois a sete anos, até que sintomas se manifestem. O Ministério da Saúde reconhece casos atípicos, em que esse período foi mais curto (sete meses) ou mais longo (dez anos).

A hanseníase provoca alterações na pele e nos nervos periféricos, podendo ocasionar, em alguns casos, lesões neurais. São as sequelas, que geralmente resultam em incapacidade física. As alterações na pele costumam gerar pontos sem nenhuma sensibilidade ao toque.

Maranhão e do Pará são os que concentram mais quadros do grau 2 de incapacidade física, quando a análise se restringe a pacientes com até 15 anos de idade. O Tocantins tem a maior taxa entre a população geral, de todas as faixas etárias.

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