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Zeno Veloso

Zeno Veloso é jurista, especializado em Direito de Famíliia. Escreve toda semana sobre os temas jurídicos que impactam no nosso cotidiano. | zenoveloso@hotmail.com

Jorgito, o Testamento e as Cláusulas Restritivas

Zeno Veloso

Mercedes nasceu na Espanha, casou-se jovem e veio para Belém do Pará, ajudar o marido, português, a construir grande fortuna. Tiveram três filhos. Dois deles trabalhavam com os pais. O terceiro, Jorgito, não trabalhava com ninguém. Nem estudava. Vivia se divertindo. Adorava ser chamado de “playboy”, nome gentil dado, na época, para os meninos vagabundos de famílias ricas, ou falsamente ricas.

A vida inteira, Mercedes teve um só advogado, também seu conselheiro e amigo, chamado Cécil Meira. E foi ele que elaborou a minuta do testamento público que ela outorgou. No testamento ficou constando que todos os bens que coubessem a seu filho, Jorgito, ficavam gravados com as cláusulas de inalienabilidade, incomunicabilidade e impenhorabilidade. E assim tudo ocorreu quando a testadora faleceu, e dessa forma ficou.

Dizem os autores (Marcelo Truzzi Otero, “Justa Causa Testamentária”, pág. 51) que essas cláusulas restritivas ou gravativas representam uma limitação de poder. Só podem ser apostas em atos gratuitos, "intervivos" - a doação, e "mortis causa" - o testamento. Não se pode estabelecê-las em contratos onerosos. Cada uma delas tem sua finalidade, sua razão de ser.

A principal, mais importante, e abrangente, sem dúvida, é a cláusula de inalienabilidade, que, como o nome indica, proíbe que o dono aliene o bem que é de sua propriedade. Ou seja, não pode transferi-lo voluntariamente a outra pessoa. Estão vedadas a compra e venda, a doação, a permuta, a dação em pagamento do bem bravado. A inalienabilidade pode ser temporária (por cinco anos, por dez anos, por exemplo), ou vitalícia - por toda a vida do proprietário do bem. Mas não pode ser perpétua, eterna. Com a morte do dono, a inalienabilidade se extingue, e o bem segue livre, sem o gravame, para os seus sucessores.

A cláusula de inalienabilidade pode ser relativa, quando, por exemplo, só é permitida a venda do bem a determinadas pessoas. Já tive um caso em que o testador estabeleceu a cláusula de inalienabilidade, mas permitiu que o bem fosse alienado se os adquirentes fossem os irmãos do proprietário.
Se o dono descumpre a proibição e aliena o bem gravado, a sanção é a nulidade da alienação, pelo menos, assim pensa a doutrina majoritária.

A inalienabilidade não se estende aos frutos e rendimentos da coisa gravada. A não ser que exista cláusula expressa prevendo a situação. Mas, convenhamos, a propriedade perde qualquer sentido e significado social estando limitada a tal extremo.

A cláusula de impenhorabilidade faz com que o respectivo bem não responda pelas dívidas do proprietário. O credor não pode requerer a execução de um bem do devedor, se este for impenhorável (CPC, art. 832).

Por derradeiro, a cláusula de incomunicabilidade faz com que não se comunique o bem gravado, ou seja, mesmo que o dono esteja casado sob o regime da comunhão, o bem incomunicável não se comunica.

Estabelecida a cláusula de inalienabilidade, esta envolve ou compreende a de incomunicabilidade e da impenhorabilidade (Código Civil, art. 1.911).
Jorgito, agora homem idoso, quer fazer testamento dispondo de seus bens. Um amigo dele, desse tipo metido a “sabe tudo”, garantiu que isso era impossível, por serem os bens inalienáveis. Bobagem! O efeito da cláusula restritiva é durante a vida do dono dos bens. Não se estende para a eternidade. Com a morte do Jorgito, os bens passam livres e desonerados a seus herdeiros. A não ser que Jorgito estabeleça também cláusulas restritivas aos bens.

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