Tempo, também, para (re)construir

Passada a eleição municipal, sobrevém um rescaldo, semelhante aos de outros pós-eleitorais, principalmente quanto as previsões e palpites de sempre, com a inconsistência de tudo que envolve os humores e decisões das massas populares, tão volúveis quanto imponderáveis pela própria natureza. Troféu negativo especial para os institutos de pesquisas, que novamente erraram feio, ampliando o descrédito em que decaíram, desde que concluíram, em 2018, pela derrota de Bolsonaro para qualquer dos demais rivais e ele é o presidente da República, justificando a máxima do saudoso presidente Itamar Franco de que os números não mentem, mas os mentirosos fabricam números mentirosos...

Conceitos inerentes à brasilidade, inspirados na exaltação de Euclides da Cunha ao sertanejo, para considerar que o brasileiro é um forte, refletem a eterna crença de todos no porvir, resumida na conceituação "enquanto há vida, há esperança". Bem que os resultados das urnas poderiam propiciar leituras de erros a serem corrigidos e  potencializar acertos que possam ter ocorrido, transformados em experiências necessárias à adoção de melhores práticas e costumes, decisivas para proporcionarem aos municípios, estados e ao país a viabilização do caminho para o desenvolvimento e a paz almejados, fundamentais para que se possa construir e consolidar uma sociedade mais justa e humana.

Reza o "Eclesiastes" haver um tempo determinado "para tudo debaixo dos céus", palavras com as quais o rei Salomão expressou uma das tantas manifestações de sabedoria, que os tempos haveriam de confirmar. Os povos têm testemunhado, desde então, quantas coisas e acontecimentos tiveram seus tempos para nascer e para morrer, bem como tempo para construir e tempo para derrubar, tempo para amar e tempo para odiar, arrematando o sábio com o questionamento sobre “Que vantagem tem o realizador naquilo em que trabalha arduamente?” Embora perdidas tantas oportunidades, sempre haverá um tempo também para se (re)construir as estruturas e os valores do povo e da Nação.

Entre as lições, erros e acertos emitidos pela voz das urnas, convidam à reflexão os milhões de eleitores que não votaram, contabilizados nos 35% da média nacional de abstenção. Em Belém, foram 20%, ou 209 mil eleitores, quase competindo com a votação dos concorrentes. Qualquer leitura, mostrará que a imensa maioria dos faltosos está decepcionada com a política e com os políticos, descrente das lideranças, requerendo profunda revisão de conceitos e no comportamento, a partir da reconstrução dos partidos e restabelecimento das fidelidades programáticas e ideológicas. Quanto às instituições e seus integrantes se resignem, num "mea culpa" há muito devido aos brasileiros.

Aguçar os ouvidos para as vozes das ruas, simbolizando os votos ausentes das urnas, verá a necessidade de mais um tempo de (re)construir a própria democracia que tantos proclamam mas nem todos protegem. Nomes e formas têm mascarado o desvirtuamento daquilo que na origem grega consistiria numa seleção em que qualquer cidadão limpo e de bons costumes poderia ocupar cargos públicos, bem como de uma instituição legislativa com a participação de todos, escolhidos no que viria a ser o processo eleitoral. Não se façam "ouvidos de marcadores" aos protestos silenciosos da perigosa abstenção eleitoral e clamores por uma (re)construção política e administrativa há tempos reclamada.