Da Catedral a Basílica, percurso do Círio revela história da arte

É possível fazer um passeio pela história arquitetônica da ocupação do espaço urbano

VALÉRIA BARROS
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O Círio de Nazaré traça a história da ocupação do espaço geográfico de Belém e da expansão da cidade, desde a Cidade Velha, onde está a Catedral, até o Centro, em Nazaré, onde fica a Basílica Santuário. Nesse trajeto, a arquitetura é a principal marca da passagem do tempo e das diversas fases de Belém ao longo de mais de dois séculos.

Arquiteto, urbanista, professor universitário e coordenador do Fórum Landi, Flávio Nassar lembra que o Círio tem sua origem em razões de Estado. O primeiro Círio foi instituído, em 1793, pelo Governo de Souza Coutinho.

image Flávio Nassar (Igor Mota / O Liberal)

“Não se caracterizava como uma iniciativa religiosa, nem popular, muito menos do Bispo”.

Ele lembra que Nossa Senhora de Nazaré era padroeira do reino de Portugal e, como aqui havia certa devoção, era interesse do Reino essa união cultural. Nessa época, a Catedral e a Igreja de Santo Alexandre já existiam, mas as primeiras procissões saíram da capela do Palácio do Governo até as margens do igarapé Murutucu.

“Primeiro, construíram a capela de Plácido para abrigá-la, e depois uma ermida, seguida da igreja, prédio que hoje fica ao lado da atual Basílica”.

Ele destaca que a imagem da Virgem de Nazaré foi encontrada nos arrabaldes da cidade, na então área pobre de Belém, distante da área nobre, onde moravam os governadores e membros da corte.

LANDI

“É nesse trajeto que vemos a expansão acontecer”, diz ele, ao observar que o traçado da arquitetura colonial conecta a área mais nobre da cidade ao arrabalde.

“Uma área nobre que se expande para um interior longínquo, na beira de uma estrada”, nota o arquiteto.

O arquiteto italiano Antonio Landi morreu em 1791 e, portanto, não acompanhou nenhum Círio, mas foi justamente na área do trajeto da procissão que deixou as suas principais obras, entre as quais a Catedral de Belém, o Palácio do Governo, o Hospital Militar (Casa das 11 janelas) o Quartel e a igreja do Carmo.

image Catedral de Belém (Oswaldo Forte / Arquivo O Liberal)

“São nesses prédios que toda riqueza e simbolismo da cidade estão concentrados”, diz Nassar, ao observar que, quando o colonial se expande e liga a cidade ao campo, o rico ao pobre, a estrada utilizada é justamente a de Nazaré (hoje avenida Nazaré).

“Quem tinha dinheiro construiu as casas de finais de semana, as rocinhas, das quais temos uma preservada no Museu Paraense Emílio Goeldi”.

O ponto onde foi encontrada a Santa, foi sem dúvida indutor do crescimento da cidade, observa Nassar. Ele relata que onde é hoje o Largo de Nazaré viveram pesquisadores de renome, a exemplo do médico, botânico, antropólogo Carl Friedrich Philipp von Martius, um dos mais importantes pesquisadores alemães que estudaram o Brasil, especialmente a Amazônia, e os naturalistas Henry Walter Bates e Alfred Russel Wallace.

“Essa área era o último estágio antes da mata, então pela proximidade, era o local mais adequado para se hospedar”, observa Nassar.

FASES

Na estrada de Nazaré ou do Maranhão, havia também um descampado com uma feira agrícola, instituída pelo Souza Coutinho, ponto de atração ao redor do qual a cidade se expandiu.

“Foi o primeiro ponto indutor do desenvolvimento, depois da Campina”, destaca Nassar, para quem o percurso do Círio revela as várias fases vividas por Belém.

“Nós podemos ver Belém bem caracterizada no período da economia das drogas do Sertão, Belém da borracha e Belém da decadência. Todas essas fases mostradas nesse percurso do Círio”, ressalta o arquiteto, ao mencionar a degradação dos prédios erguidos no período da Borracha.

Em relação ao modernismo, ele aponta a avenida Presidente Vargas, onde se destacam o prédio da antiga Importadora de Ferragens, o Palácio do Rádio, os Correios, o INSS e os dois prédios na avenida Presidente Vargas, na esquina da Piedade.

“Isso é a Belém contemporânea das grandes manifestações artísticas. Na avenida Nazaré, a sede do Remo e algumas outras construções modernistas, que não são mais do período áureo da borracha”, diz ele.

DECADÊNCIA

Sobre a relevância desse acervo, Flávio Nassar frisa que a Catedral de Belém é a maior construção religiosa nos domínios portugueses. Em estilo barroco, do período colonial, ela contrasta com a Basílica, de estilo leve e eclético.

“De um lado temos a Catedral, maciça, fachada assentada; e do outro a Basílica, com essas torres finas e fechadas e suas colunas. Há um contraste imenso entre as arquiteturas das duas”, diz ele.

“Embora a cidade e o centro histórico não estejam bem conservados, as obras de Landi estão”, afiança o arquiteto, que lamenta o fato de Belém ter perdido duas casas senhoriais por ele construídas na João Alfredo e o quartel do Exército, na Praça da Bandeira.

“O primeiro quartel era obra do Landi. Foi demolido para a construção desse atual, o Engenho Murutucu sofreu uma agressão criminosa, só restou a igreja. A casa foi destruída e era o local onde Landi morava”.

Flávio Nassar diz que a riqueza do acervo artístico de Belém está no fato de que a cidade é um percurso da história da arte.

“De 1700 até nossos dias, mas a degradação física vivida pela cidade equivale à sua decadência econômica”.

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Círio
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