Covid: Cidade que queria ‘proibir’ mortes está com o cemitério lotado
Prefeitura de Biritiba-Mirim chegou a enviar à Câmara projeto tentando ‘impedir’ que as pessoas morressem no município
O coordenador do cemitério municipal de Biritiba-Mirim, no interior de São Paulo, Sebastião Antunes, mais conhecido como Tião, tem uma tarefa difícil: aumentar as vagas no cemitério da cidade até abril.
Existem apenas 15 vagas no cemitério, mas a meta de Tião é preparar mais 40 covas.
Biritiba-Mirim, na Região Metropolitana de São Paulo, a 61 km da capital, tem população estimada de 32,8 mil habitantes. Desde o início da pandemia, segundo dados oficiais, morreram 46 pessoas de covid-19.
Apesar de parecer pouco, é o suficiente para que o cemitério recebesse mais sepultamentos que a média.
O prefeito Carlos Alberto Taino Júnior, conhecido como Inho, está preocupado. Afinal, a cidade tem 217 pessoas com casos ativos de covid neste momento.
Tanto o prefeito como o coordenador do cemitério tem apelado para que a população respeite as normas sanitárias, para que a cidade não reviva um drama de 16 anos atrás.
“A obra teve uma pausa por conta do mau tempo, mas agora estamos fazendo tudo o mais rápido possível. Teremos 40 vagas e vai ter vaga se precisar, numa urgência. Estamos acelerando para que aquele episódio que aconteceu no passado fique no passado”, declarou Inho.
“Não morra”
Em 2005, o então prefeito Roberto Pereira da Silva, o Jacaré, enviou um projeto de lei que queria proibir a população de morrer na cidade. A Câmara não embarcou na ideia e o rejeitou.
Na ocasião, o antigo cemitério, de 1910, estava sem vagas, tanto que os mortos passaram a ser sepultados nos corredores do campo ou amontoados nos jazigos. “Uma indignidade”, diz o ex-coveiro José Barreto.
A situação já havia se agravado um ano antes, quando Jacaré decretou “estado de calamidade para enterros”. A tentativa de construção de um novo cemitério esbarrava na legislação ambiental. Quase 90% do território de Biritiba-Mirim fica em uma região de mananciais, o dificulta a expansão de cemitérios tradicionais.
Os cemitérios precisam de uma preparação adequada, pois os corpos dos mortos liberam uma substância chamada necrochorume, que pode contaminar lençóis freáticos e reservas subterrâneas.
“A gente fez essa lei para chamar a atenção das autoridades, para que ajudasse a buscar uma solução”, diz Jacaré.
Capital do agrião
A dificuldade ambiental aumentava porque a cidade produz 50% do agrião em São Paulo e é considerada a capital do agrião. E um cemitério poderia prejudicar a qualidade da hortaliça.
Ao “proibir” a população de morrer, a cidade chamou a atenção nacional e conseguiu uma reunião no Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).
“A lei foi polêmica, mas foi boa. Se não fosse aquilo, talvez não tivéssemos o novo cemitério. Foi a maneira que encontramos de pressionar, porque era uma urgência”, declarou José Barreto, coveiro da cidade na época.
Permissão
O Conama acabou permitindo a construção de um novo cemitério, obedecendo uma série de regras para evitar a poluição da água dos mananciais e da irrigação do famoso agrião.
Em dezembro de 2010, Inho, já prefeito da cidade, inaugurou o cemitério Firmino Antônio Dias, no Jardim Takebe, com capacidade para 12 mil sepultamentos.
Agora está sendo ampliado, mas o processo é delicado, devido às necessidades ambientais.
Enquanto isso, o prefeito apela ao bom senso da população para que evite aglomeração e se proteja.
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